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Propósito no Trabalho: Remédio ou Veneno?

Propósito no Trabalho

Imagine você sentado, ouvindo a primeira palestra do ano da sua empresa, onde o propósito vai ser apresentado. O seu CEO está apresentando uma visão aspiracional e inspiracional do que a empresa quer se tornar. De como em pouco tempo vocês podem se tornar a maior empresa do ramo no mundo, e que para isso todos tem que olhar na mesma direção.  

Você se sente, meio desconectado desse discurso. Por mais que faça sentido pra você, você ainda não se vê dentro desse contexto. Não entende qual o seu propósito em toda essa  estratégia ou pelo menos não compartilha essa energia.

Quando você olha pro lado, uma colega está com os olhos cheios d’água, nitidamente emocionada porque ao contrário de você ela está totalmente conectada com a missão da empresa e ela se vê como parte fundamental desses objetivos.

O que será que acontece que faz com que umas pessoas se conectem tão fortemente ao propósito de uma empresa e outras achem essa realidade algumas vezes até tóxica para elas?

Um Exemplo da HP: Cultura Voltada ao Propósito

Não sei se vocês conhecem o CEO da HP, Enrique Lores, se não conhece não tem problema, é só pra contextualizar que ele trouxe uma cultura para a HP de que a empresa deve ser orientada à propósito, é parte da marca da empresa, como se fosse uma característica do DNA da empresa.

E agora, em 2023, ele fez uma pesquisa com 15.000 funcionários e descobriu que apenas 27% deles têm uma relação saudável com o trabalho e se conectam com o propósito da empresa. 

E se você acha que isso é uma novidade, que é algo específico da HP, saiba que há mais de 20 anos pesquisas de engajamento de funcionários, como a da Gallup, vem mostrando que esse índice dificilmente ultrapassa os 30%.

Ah Bruno, mas mesmo sem engajamento as pessoas trabalham, não é ?

Claro, as pessoas trabalham porque precisam, porque dependem do salário, mas não porque são felizes ou entusiasmadas, não porque se sentem queridas e apoiadas pelos colegas e pela empresa. 

E com isso, em pouco tempo, começa a surgir o sentimento de ansiedade, que muitas vezes pode virar uma depressão e fazer com que essa pessoa acabe se afastando do trabalho.

Além disso, se sentir infeliz ou desmotivado, vai acabar criando um ambiente que propaga esse sentimento, pouco a pouco as pessoas vão se tornar “sonâmbulas do trabalho” , sabe, aquelas que estão dedicando o tempo delas mas sem paixão nenhuma, você com certeza já viu alguém assim.  

O Papel do Propósito na Vida

Nós, seres humanos, estamos sempre em busca de um “significado pra vida”, e esse significado muitas vezes está ligado a questões religiosas,  família, encontrar a tal alma gêmea, aquela pessoa que te completa, ter filhos ou adotar uma criança.

Mas o fato é que significados mais voltados para o lado social têm diminuído muito a importância na vida das pessoas, que têm voltado o seu propósito para o trabalho, pensando que grande parte do tempo elas estão se dedicando a esse propósito.

E claramente as empresas têm entendido isso, e usado isso a seu favor, de forma idônea ou não.  Eu tenho um pouco mais de 20 anos de carreira, eu vi mudanças na cultura de empresas que muitas vezes eram voltadas à resultados a qualquer custo, crescimento exponencial, métricas para eficiência se tornarem culturas ligadas a busca pela cultura de leveza, uma vida equilibrada, liderança com coração e sustentabilidade.

Isso é fantástico, e eu acho que esse momento é o remédio para muitas doenças que vinham surgindo com as antigas culturas tóxicas voltadas apenas para o resultado, passando a ter um olhar de equilíbrio entre pessoas e empresas.

A Importância do Equilíbrio: Remédio ou Veneno?

Mas, a diferença entre o remédio e o veneno muitas vezes é a dose. Com as mudanças recentes, surgiram empresas lideradas por CEOs engajados, defensores apaixonados de causas culturais, sociais e ambientais, visando estreitar laços com seus funcionários. No entanto, essa conexão, por vezes, é superficial.

Bruno, não entendi, você é a favor ou contra essa cultura de propósito nas empresas?

Eu sou totalmente a favor, eu acho que temos sim que ter um alinhamento claro do propósito da empresa para avaliar se nossos valores e nossos motivadores pessoais, que são únicos, estão alinhados com os da empresa, essa é a forma mais forte de gerar uma conexão de lealdade.

O que eu não acho é que esse deve ser o nosso motivador principal da vida, que o nosso significado de viver deveria ser o trabalho. Simplesmente porque a vida é composta de diversas camadas e simplificar isso pode até nos dar uma maior motivação em um momento, mas em outro momento vai acabar nos frustrando.

Além disso, pensa como é arriscado apostar todas as fichas do meu propósito de vida em algo que muitas vezes não está na nossa mão controlar, que pode deixar de existir de um dia pro outro, que simplesmente não é recíproco suficiente para dizer que o propósito das empresas são as pessoas que trabalham nela. É duro, eu sei, mas é real.

E como achar esse equilíbrio ?

O Propósito no Trabalho: Ser Feliz

O primeiro passo é entender que propósito pode ser algo aspiracional, algo que você busca alcançar pra te fazer feliz e que ele pode sim, mudar ao longo do tempo, eu posso ter o propósito de desenvolver pessoas como líder e depois que meu filho nascer mudar pra ser o melhor pai que ele pode ter.

Repare que não precisa ser algo tangível, pode ser algo inspirador, mas que ao longo do tempo você vai definir como você vai fazer isso de acordo com as suas crenças, valores, aprendizados e vivências. E aí sim, isso vai acabar se conectando com objetivos e metas tangíveis. 

E quando você está pensando no trabalho ? O seu propósito é o que ? Ascender na profissão, ganhar dinheiro? Ser feliz ?

Bem, se você chutou ser feliz, acertou, diversas pesquisas como a da Mckinsey mostram que mais de 80% dos funcionários tem como prioridade serem felizes no trabalho.

Mas como fazer isso em um contexto de mundo tão complexo, não-linear, cheio de incertezas?

Aí é onde está a beleza da conexão do propósito da empresa. Imagine que você tem clareza do propósito da empresa e que ele está alinhado sim com seus valores, suas crenças e que você efetivamente acredita nesse propósito.

A Conexão Entre o Propósito Pessoal e Empresarial

Mas porque então existem pessoas desconectadas, infelizes e desmotivadas nas empresas, já que tudo parece tão simples?

Em geral, porque em algum momento o líder quebrou a confiança. O que acabou gerando um desapontamento e fez com que a pessoa perdesse essa forte conexão com a empresa e com o seu propósito.

Esse não é o único motivo. Também pode ser falta de transparência na comunicação, falta de clareza sobre o propósito da empresa ou até mesmo desalinhamento. Pode ser que o propósito não tenha realmente alinhamento com o que você está buscando para sua vida e neste caso, esse relacionamento tende a acabar.   

Perguntas para Reflexão: Líderes e Liderados

Então pra fechar o tema, eu vou deixar aqui alguns questionamentos que você como líder deve ser fazer:

Líderes:

  • Você conhece bem a sua equipe? Sabe o que é importante para cada um deles e como o desempenho deles se conecta ao propósito deles?
  • Você consegue adaptar seu jeito e comportamento para inspirar sua equipe sem ser melodramático?
  • Quando você pede para sua equipe se comprometer, quão comprometido você está em apoiar o que é significativo para eles ?
  • Como você equilibra suas ambições pessoais com as responsabilidades de liderança?
  • Será que a visão, valores e missão da empresa batem com o que seus funcionários consideram significativo?
  • Como você administra as expectativas para garantir que todos estejam na mesma página? Como você cria harmonia junto ao time?

E para os liderados, também vou deixar algumas perguntas para reflexão :

  • Até que ponto você está trabalhando com pessoas que compartilham seus valores?
  • Sua empresa te enxerga como alguém além do trabalho? Eles têm alguma responsabilidade pelo seu bem-estar e crescimento pessoal?
  • Como você pode planejar sua vida para que as interrupções no trabalho não baguncem tudo?
  • Você consegue distinguir entre o que é importante e o que é só interesse passageiro na empresa?
  • Você percebe a dança entre ser autêntico e apegado ao trabalho e os riscos associados?
  • Como tem sido sua busca por significado ao longo do tempo? O que te fez pensar nisso?
  • O que você aprendeu sobre si mesmo e como isso afeta suas decisões agora?
  • E se o trabalho não for mais o seu “templo”, o que mais pode te dar esse senso de significado e comunidade?

Se preferir pode acompanhar ouvir o conteúdo no Podcast Spoilers da Vida:

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