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Emoções Reprimidas Nunca Morrem

Homem sentado no chão, com expressão de dor emocional, enquanto luzes saem de seu peito; sombras observam ao fundo e um feixe de luz entra pela janela.

Você já se pegou explodindo por algo aparentemente pequeno? Imagine a cena: você está no trânsito, alguém corta sua frente e, de repente, um simples ato vira o estopim para uma explosão de raiva. Mas será que foi mesmo só sobre o trânsito?

Eu vou te mostrar até o final deste artigo que nem sempre o fato é o real motivo do seu comportamento. Às vezes ele é apenas um gatilho para o que está guardado lá dentro.

 

A Armadilha Invisível das Emoções Não Expressadas

Desde pequenos, aprendemos, ou somos forçados a aprender, que certas emoções “não podem” ser sentidas. Frases como:

  • “Engole o choro.”
  • “Homem não chora.”
  • “Não faça escândalo.”
  • “Fique feliz, você não tem motivos para estar triste.”
  • “Você não tem razão para estar triste, você tem tudo que nunca tive.”

Esses são apenas exemplos, mas nos ensinaram a esconder o que sentimos. Só que a emoção não desaparece porque foi ignorada ou escondida. Na verdade, ela se transforma.

Alguns estudos das escolas de medicina das universidades de Harvard e Stanford mostram que reprimir emoções aumenta os níveis de estresse no corpo, elevando os riscos de ansiedade, depressão e até doenças cardiovasculares.

É como jogar lixo debaixo do tapete: ele sai da vista, mas o cheiro continua ali.

O Ciclo da Repressão Emocional (e Como Ele Sabota Sua Vida)

Vamos entender de forma simples esse ciclo:

  1. Você sente algo, tristeza, raiva, medo.
  2. Por vergonha ou medo de julgamento, reprime.
  3. A emoção não desaparece, apenas se acumula no seu “porão emocional”.
  4. Mais situações se somam, e o peso aumenta.
  5. Chega o dia da “explosão”: ansiedade, crises de pânico, compulsões, doenças físicas.

Quanto mais você ignora, mais o corpo encontra maneiras de alertar que algo não vai bem.

Como diria o psicólogo Pierre Weil: “O corpo fala o que a boca cala.”

Emoções Não São Inimigas: São Sinais de Sobrevivência

Você já reparou que a maioria das emoções básicas é negativa? Raiva, tristeza, medo, nojo… e só uma é positiva: a alegria.

Isso tem uma razão. Toda emoção tem um propósito.
Nenhuma delas é vilã. Elas existem para nos proteger e orientar, para nos ajudar a sobreviver.

Por exemplo:

  • Raiva: sinal de que algo violou seus limites.
  • Tristeza: convite ao recolhimento e reflexão.
  • Medo: alerta para perigos (reais ou imaginados).
  • Alegria: motivação para repetir comportamentos positivos.

Imagine seu sistema emocional como uma represa. Quando a água (emoção) é bloqueada por muito tempo, a pressão interna aumenta… e, mais cedo ou mais tarde, a barragem rompe.

E quando isso acontece, o estrago é grande.

Por Que Enterramos Emoções Vivas?

Se emoções são tão importantes, por que temos tanto medo de senti-las?

A resposta é simples e complexa ao mesmo tempo: aprendemos que sentir é perigoso.

Desde a infância, experiências de rejeição, abandono e críticas formam um padrão interno. É como se o cérebro gravasse: “Sentir = perigo.”

Então, para sobreviver emocionalmente, desenvolvemos “máscaras”:

  • A pessoa sempre alegre.
  • O forte que nunca se abala.
  • O racional que não se deixa levar pelas emoções.

Essas máscaras até funcionam no curto prazo, mas quanto mais tempo ficamos longe das nossas emoções verdadeiras, mais difícil fica reconhecer quem realmente somos.

E isso gera diversos impactos psicológicos ao longo da nossa vida.

A Armadilha da Positividade Tóxica

Outro fenômeno moderno que reforça a repressão emocional é a positividade tóxica.

Você já deve ter visto frases como:

  • “Pense positivo, sempre!”
  • “Gratidão resolve tudo!”
  • “Seja feliz, não importa o que aconteça!”

Embora a gratidão e o pensamento positivo sejam práticas poderosas, quando usados como muletas para evitar emoções desconfortáveis, eles perdem seu efeito e o remédio se torna veneno.

Fugir do que você sente em nome de “ser positivo” é apenas outro nome para reprimir suas emoções.

Quando o Corpo Começa a Gritar

Você sabia que dores nas costas, crises de enxaqueca, problemas gastrointestinais e até alergias podem estar ligados a emoções não expressadas?

Segundo o médico Gabor Maté, especialista em traumas e saúde integral, “não é o estresse em si que adoece as pessoas, mas o estresse não processado, reprimido, ignorado.”

Ou seja, o que você não sente conscientemente, o corpo sente por você.

Aqui, o problema não é apenas emocional é físico também.

Quem Realmente Está no Controle das Suas Decisões?

Você já tomou uma decisão e depois ficou se perguntando:

“Por que eu fiz isso? Não faz sentido!”

Lembra da história do carro que me cortou e fui atrás dele? Se você pensar de forma racional, pergunta: por que fiz isso?
Ele pode estar armado. Eu posso causar outro acidente. O que pretendo ganhar com essa perseguição?

Mas quem disse que o lado racional está no comando?

A verdade é que grande parte das nossas escolhas é guiada por emoções e muitas vezes por emoções reprimidas, aquelas que você nem lembra mais que escondeu, mas que continuam agindo nos bastidores da sua vida.

O Iceberg das Escolhas Humanas

Imagine um iceberg:

A parte visível, acima da superfície, representa suas decisões conscientes, o emprego que você escolheu, as pessoas com quem se relaciona, as palavras que usa no dia a dia.

Tudo isso envolveu emoção e razão, mas foi algo que você percebeu.

Mas 90% do iceberg está submerso e é ali que moram:

  • Suas emoções não processadas.
  • Suas dores reprimidas.
  • Suas crenças limitantes.

É nessa parte invisível que nascem decisões automáticas, aquelas que você toma sem perceber.

E é lá que o piloto automático que comanda boa parte da sua vida foi criado.

As Crenças que Nascem das Emoções Não Processadas

Toda emoção reprimida dá origem a uma crença limitante.
Ela funciona como um atalho para acelerar decisões e manter você “seguro”. Mas esses atalhos nem sempre ajudam.

Por exemplo:

  • O medo da rejeição pode gerar a crença: “Não sou bom o bastante.”
  • Raiva não expressada pode gerar a crença: “Preciso agradar para ser aceito.”

É como usar óculos com lente distorcida, você vê algo, mas não percebe que o problema está na lente, não no mundo.

Agora Que Você Entende o Que Está por Trás das Suas Decisões…

Agora que você compreendeu como as emoções reprimidas moldam sua forma de pensar, sentir e agir, é hora de entender o preço que você paga na sua vida.

Quando você reprime suas emoções, começa a viver com o freio de mão puxado.

Você:

  • Acorda cansado mesmo dormindo bem.
  • Sente um vazio constante, como se nada fosse suficiente.
  • Perde o entusiasmo por coisas que antes te davam prazer.
  • Fica irritado por pequenas coisas e depois se culpa por isso.
  • Vive em alerta.
  • Tenta agradar todo mundo esquecendo de si mesmo.

Esse é o custo muitas vezes silencioso das emoções enterradas vivas.

E quanto mais você tenta controlar tudo, mais difícil fica.

Impactos Profissionais: Quando o Passado Diz o Futuro

E digo mais: as emoções não processadas não ficam só em casa, elas vão com você para o trabalho.

  • O medo da rejeição faz você evitar reuniões ou esconder ideias.
  • A raiva contida leva você a aceitar sobrecargas sem dizer “não”.
  • A insegurança disfarçada de perfeccionismo te deixa exausto, sempre tentando provar algo.
  • A necessidade de aceitação transforma você em alguém que vive para agradar e depois se frustra quando não é reconhecido.

E quanto mais você tenta compensar isso com produtividade, mais o corpo e a mente cobram: ansiedade, procrastinação, insônia e, muitas vezes, burnout.

O Dia em Que Rafael Percebeu que Não Era o Trabalho que o Cansava

Vamos ver uma história real que ilustra bem isso:

Imagine um jovem de 30 anos chamado Rafael. Ele trabalha como analista de sistemas e sempre foi o “forte” da equipe. O primeiro a chegar, o último a sair. Nunca reclamava. Nunca faltava. Sempre dizia que “estava tudo bem.” Até que, numa segunda-feira, ele travou diante do computador. Não conseguia digitar. Não conseguia pensar. O corpo inteiro tremia, o coração disparava.

Ele não entendeu o que estava acontecendo, tentou trabalhar no dia seguinte novamente, e não aceitava que não estava no controle do que estava acontecendo. Ele se sentiu fraco e pediu desculpas o tempo todo por não conseguir produzir mais. E quanto mais ele tentava, menos produzia. Até que resolveu ir ao pronto-socorro porque achou que estava tendo um infarto de tanto que o coração acelerava.

O médico disse que era uma crise de ansiedade, mas Rafael jurava que não tinha motivos: “minha vida está em ordem, meu trabalho é estável, minha família está bem.” O médico então sugeriu que ele fizesse acompanhamento com um psicólogo. Que obviamente não foi a primeira coisa que Rafael fez , mas depois de mais uma semana assim, não teve como fugir. Foi só meses depois, em terapia, que ele entendeu: Não foi o trabalho que deixou ele assim. Foi o peso acumulado de anos engolindo frustrações, raivas e medos, fingindo que nada o abalava.

Cada “tá tudo bem” dito para evitar conflito era uma pequena negação de si mesmo.

E o corpo, cansado de gritar e não ser ouvido, finalmente “quebrou”.

Rafael não precisava de férias.
Ele precisava voltar a sentir.

Depois disso, com a mente mais clara e novos comportamentos trabalhados, ele voltou a ser uma pessoa produtiva, transparente e respeitando seus limites e valores.

A Chave para Romper o Ciclo Emocional

E a gente sabe que o Rafael não é exceção, não é?

Todos nós, em algum momento, criamos mecanismos de defesa para suportar o que não soubemos sentir.

O problema é que, com o tempo, esses mecanismos deixam de proteger e passam a nos aprisionar, controlando nossas decisões e comportamentos.

Romper o ciclo das emoções reprimidas não é sobre “deixar de sentir”, mas sobre aprender a sentir com consciência.

E isso começa por três pilares simples: Reconhecer, Processar e Reprogramar.

1. Reconhecer: Dar Nome ao que Sente

Você não pode transformar o que não reconhece.
Como sempre, a clareza é o começo de tudo.

Por isso, o primeiro passo é trazer suas emoções à luz, sem julgamento.

Em vez de dizer “estou mal”, pergunte a si mesmo:

  • “O que exatamente estou sentindo agora?”
  • “Onde isso aparece no meu corpo?”
  • “Qual mensagem essa emoção está tentando me dar?”

A raiva pode estar dizendo que seus limites foram ultrapassados.
A tristeza pode estar pedindo pausa.
O medo pode estar tentando te proteger de algo que não existe mais ou que não vai existir no futuro.

Essa prática desperta a consciência emocional, um dos pilares da inteligência emocional.

2. Processar: Sentir de Forma Segura

Depois de reconhecer, é hora de permitir que a emoção se mova.

Emoções são energia em movimento (do latim emovere, “mover-se para fora”).

Se não fluem, adoecemos.

E você não precisa fazer isso de forma complexa. Existem práticas muito simples que ajudam bastante:

  • Respiração consciente: inspire em 4 tempos, segure por 2 e expire em 6.
    Essa respiração reduz o cortisol e sinaliza ao corpo: “Está tudo bem sentir.”
  • Escrita terapêutica: escreva o que sente sem filtrar. Dê voz à raiva, ao medo, à frustração.
    Termine com a frase: “Eu escolho liberar isso do meu corpo.”
  • Movimento intuitivo: coloque uma música e deixe o corpo se mover, sem vergonha de se soltar.

Essas práticas ensinam o cérebro que sentir não é perigoso.

3. Reprogramar: Agir Diferente Mesmo com Medo

Reconhecer e sentir é metade do caminho. A outra metade é agir diferente diante do velho padrão. Toda vez que você responde de forma nova a um velho gatilho, o cérebro cria um novo caminho neural. Esse processo, chamado neuroplasticidade, é o que transforma padrões emocionais em comportamentos mais automáticos.

Por exemplo:

Se o seu padrão é se calar para evitar conflito, o novo passo é expressar sua opinião com calma.

No começo, o corpo vai resistir — você vai tremer, suar, querer parar. Mas a cada repetição consciente, o cérebro entende: “Agora é seguro me expressar.”

E é aí que o ciclo começa a se desfazer.

Não é fácil, mas é simples e depende da sua intenção de querer mudar.

O Poder da Autorresponsabilidade Emocional

Assumir responsabilidade pelo que sente não significa se culpar. Significa parar de entregar seu poder a fatores externos. Você não controla o que acontece, mas pode decidir como reagir.

E essa escolha, consciente e repetida, define sua liberdade emocional e ajuda você a moldar os comportamentos que precisa para ter a vida que quer.

A repressão emocional é um ciclo, mas a libertação também pode ser. A diferença está em qual lado você escolhe repetir. Você pode continuar negando o que sente, tentando controlar tudo e assistindo o corpo e a mente entrarem em colapso… Ou pode começar agora um novo ciclo — o da consciência, do equilíbrio e da leveza.

 

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