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Antes de sermos cargos somos pessoas

Antes de sermos cargos somos pessoas

O artigo desta semana traz uma reflexão. Por mais que ao longo da vida, a gente adquira papéis, títulos, cargos, continuamos sendo pessoas, com sentimentos passíveis às intempéries do dia a dia e passando pelo mesmo cenário de risco e de pandemia que todos estamos vendo.

Decidi abordar este tema, depois de ter conhecimento de um acontecimento recente na nossa política. Aproveito para deixar claro, que não é um artigo com viés político e está pautado na minha opinião. Cada um de vocês tem total direito de pensar diferente de mim e fiquem à vontade para debatermos. Mas assim como eu respeito opiniões diferentes, peço apenas que respeitem a minha opinião.

Você acredita na pandemia?

Vocês devem ter visto recentemente todo esse movimento de substituição do Presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco. Não vou entrar no mérito se ele deveria ou não ser substituído, porque, como expliquei, não é este o objetivo desse artigo.

Em 5 de fevereiro ele teve uma reunião com o Presidente e alguns ministros, cujo objetivo era explicar a razão do reajuste do diesel. Normal, não é? Faz todo sentido.

Castello Branco chegou usando uma máscara N95 e óculos de proteção. Para quem não sabe, a N95 é considerada uma das máscaras mais efetivas contra a Covid. Ele entrou e cumprimentou todos de maneira formal, sem contato físico.

Ninguém do recinto seguia o protocolo de segurança ou usava máscaras. Apenas o Ministro Paulo Guedes que a retirava enquanto falava. Vocês podem conferir a notícia neste link.

Mesmo que a gente entenda que é direito de todos acreditar ou não na pandemia, também é direito do Castello Branco não querer se colocar em risco. Por estar no grupo de risco, ele decidiu se prevenir. Manteve distância segura e seguiu todos os protocolos que uma PESSOA de 73 anos tem que se preocupar neste cenário.

Ao invés de respeitarem sua decisão, Castello Branco foi criticado, e motivo de risos quando questionado por que ele foi “vestido de astronauta” para a reunião no palácio.

11 meses sem trabalhar?

O trecho a seguir foi retirado da revista Época, após a declaração da troca do Presidente da Petrobras, e se refere ao ponto de vista do Presidente da República em relação à atuação de Castello Branco:

“O atual presidente da Petrobras está há 11 meses em casa, sem trabalhar. Trabalha de forma remota. Agora o chefe tem que tá na frente, bem como seus diretores. Então isso pra mim é inadmissível.”

Não vou entrar no mérito se durante esses 11 meses a atuação dele foi boa ou ruim, estou trazendo o contexto de pessoas e teletrabalho para esse episódio. Agora eu vou entrar um pouco no que eu acredito e que se baseia na minha opinião, ok ?

Antes de cargos, somos pessoas!

Antes de tudo somos pessoas. Pessoas que estão passando por momentos de ansiedade, com medo de morrer ou que alguém que a gente ama sofra ou passe por momentos de dificuldades.

Estas são características do ser humano, provido de emoções que moldam os nossos comportamentos e que nos levam a tentar nos proteger.

Além destas preocupações, inerentes ao ser humano, temos outras preocupações: Salários, casa, comida para os filhos.  Algumas pessoas não podem ser se dar o direito de evitar um ônibus com aglomeração, um BRT cheio ou um ambiente de trabalho que não segue as normas.

Eventualmente a gente pensa, “ah é fácil resolver, é só trocar de emprego”. Mas será que com tantos receios, esse cenário vai acontecer? Acho que não, não é?

As vezes não é tão simples. Vamos pensar em um metalúrgico, um dentista, um motorista de uber, que não tem como evitar ir ao local de trabalho. Como eles fazem?

Respeito ao próximo

No meu ponto de vista, o que cabe a cada um de nós como sociedade, independente do que os órgãos públicos e privados possam fazer, é respeitar o próximo.

Se você precisa estar em um ambiente com outras pessoas e você tem medo de pegar COVID, use máscara, face shield, óculos de proteção ou luvas. Use tudo que te faz sentir seguro, você tem esse direito. Se tem alguém que não segue o mesmo protocolo, não se sinta envergonhado, é direito seu.

Por outro lado, se você não segue os protocolos, seja porque não acredita no vírus ou porque está cansado, respeite o espaço do outro. Lembre-se que você pode assumir apenas o seu risco e que as pessoas podem ter crenças diferentes das suas e está tudo bem.

Eu trabalho em uma empresa que há um ano passou a se denominar “anywhere office”, ou seja, trabalhe de qualquer lugar.  Eu sei que não é a realidade de muitas pessoas ou empresas, que às vezes têm o pensamento de que é o “olho do dono que engorda o gado”.

Não acho que podemos ser cartesianos, ser a favor ou contra. Acho que temos que respeitar uns aos outros e se o limite do respeito chegar, precisamos entender quem seria o mais impactado para tomar a decisão.

Então? Como agir?

Se eu não acredito no vírus, mas tem alguém no meu ambiente que acredita, eu tenho que respeitar essa pessoa. Para mim, não faz diferença usar ou não o equipamento de proteção individual, mas em respeito àquela pessoa, devo no mínimo manter o distanciamento, usar a máscara se precisar falar com ela e evitar qualquer tipo de contato.

Isso não influencia em nada na minha vida e nas minhas crenças, mas influencia muito na do outro.

Fazendo uma analogia, imagine que você não tem religião, mas a sua esposa é cristã e ela quer ir à missa. Ir à Igreja com ela não muda você, não desvirtua as suas crenças, não tem efeito negativo nenhum, mas para ela é uma coisa muito positiva.

Agora imagine que ela não pudesse ir à igreja por sua causa. Para você não teria efeito nenhum, mas ela ia se sentir triste e quem sabe até desrespeitada.

Existe um terceiro cenário. Você fica em casa e ela vai à missa. Cada um respeitando a individualidade do outro. Em correlação com o cenário da pandemia poderia ser um trabalhando presencialmente e o outro estando de home office.

Entendem? Temos que ser inteligentes para saber lidar com essa situação e pensamentos ortodoxos não vão ajudar a resolver, vão piorar ainda mais.

Trabalhando de casa

O segundo ponto está relacionado ao Home Office. Ainda me incomoda que as pessoas achem que quem está de casa não está trabalhando.

Eu nunca trabalhei tanto quanto trabalhei durante essa pandemia e não sou exceção. Todos com quem eu converso e que estão em home office, estão trabalhando mais. E isso não se refere à quantidade de trabalho, mas a gente se precisou se adaptar para trabalhar em casa.

Criamos novas rotinas, novos modelos de comunicação. Tudo para conseguir entregar resultados iguais ou melhores, independente dos cenários que estamos passando. E o nome disso é comprometimento.

Infelizmente, achar que quem está em casa não está trabalhando, ou está trabalhando menos é um fato que acontece bastante. O cenário do Presidente da Petrobrás foi icônico, mas isso é mais comum do que se imagina.

Quanto maior o cargo, mais existe essa percepção de que a presença é fundamental. Se o presidente vai, os diretores têm que ir.  Se eles estão ali, os gerentes têm que ir e assim por diante, cada um jogando um pouco da insatisfação no nível abaixo.

Inúmeras vezes já vi pessoas serem convocadas para uma reunião presencial simplesmente porque um dos principais patrocinadores do projeto estaria presencialmente. Mesmo a gente tendo a opção da reunião híbrida, ou seja, parte presencial, parte videoconferência.

Esse é um outro pensamento retrógrado, de que a presença é o que faz as coisas acontecerem. Quanto dinheiro é jogado fora pelas empresas, que compram áreas enormes simplesmente para juntar pessoas? Pessoas que já se mostraram competentes no modelo de teletrabalho, faz sentido?

O futuro é um modelo híbrido

Não estou dizendo que não precisamos voltar ao presencial, mas eu entendo que ele passará a ser exceção e não regra.

Uma coisa que a pandemia me mostrou é que estar em casa tem muitas vantagens. É produtivo, temos qualidade de vida, segurança, mais tempo, melhor alimentação, redução de custo, entre outros.

Mas estar isolado das pessoas, por mais que tenhamos o contato digital, tira algo que é muito importante, a nossa capacidade de socialização, de poder interagir, rir junto, conversar, olhar no olho do outro e ter empatia.

Acredito que o futuro será um modelo híbrido, com espaços de co-working e colaboração onde as fronteiras da própria empresa vão começar a ser diminuídas.

Mas enquanto isso, precisamos ser flexíveis e saber lidar com essa nova realidade, respeitando e acreditando em um modelo que está em transição.

Impacto Econômico

E por último, temos a questão econômica. Não tenho pretensão de entrar nos detalhes dos impactos econômicos globais e do país.

Mas eu entendo que tudo isso gera impactos em diversos aspectos. Pessoas que perderam emprego porque trabalhavam em restaurantes nos locais onde as empresas que fecharam ficavam. Lojas e centros comerciais que fecharam. Os próprios donos de imóveis comerciais, por exemplo, que em São Paulo reduziram quase a 50% o número de imóveis alugados.

É claro que tudo isso é impactado. Eu não fecho os olhos para isso, mas novamente, não é deixando o vírus se multiplicar e sofrer mutações mais severas e contagiosas que vamos resolver esses problemas.

O foco, no meu ponto de vista, é a vacinação em massa, hospitais adequados para o recebimento dos pacientes e políticas públicas de apoio e incentivo aos pequenos comerciantes e aos informais, que são os maiores impactados, com ações sustentáveis e não reativas e pontuais.

E acima de tudo isso que eu falei, precisamos lembrar que independente do nosso cargo ou papel na sociedade, somos pessoas. E como pessoas devemos nos perceber e olhar o próximo. Quando a humanidade é substituída por valores empresariais, políticos ou econômicos, estamos indo em um caminho muito obscuro.

Foi um artigo diferente, onde eu trago mais uma reflexão sobre quem somos e não o que somos. Cargos, papéis, salários, tudo isso muda, mas o fato de sermos pessoas é incondicional.

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